sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

BIA DE LUNA E SEU "CLIVAGENS" POESIA QUE VENCE A MORTE por jairo pereira


...quando Clivagens saiu do forno, fiz (acho que a primeira resenha) sobre o livro. Sempre aceito, uma poética que se faz densa, e quando o poeta é alguém de quem você conhece o existencial (como no caso de Bia) desregrado. “Meus olhos são bordados/Por miçangas vidrilhos paetês/CRISTAIS./Não ouse um mau/Olhado.” A poeta amalgamou todas as emoções do ser que está condenado a ser livre e perde-se na noite da urbe. Amou, sonhou, descreu, litigou, contorceu-se como as linguagens, na forja do poema-vida. A vida não é limpa e cristalina. Por trás do olhar calado, contemplativo do poeta, se represam signos sujos, causticantes. A Bia de Luna, detinha esse represar de águas paradas, thurvas, pontuado por uma ametista ou outra. Nos porões da lira, des-enthusiasmada, a objetalidade, impregnada de Bia, sujeito que se atira de cabeça nos precipícios da des-razão, para haurir poesia da melhor qualidade. “E uma ametista se acrescenta/Incrustada entre meu olhar./Colorido/Calado/Horizontal”. A Bia de Luna, era a imagem (física) de sua própria poesia. Um artesanato de linguagens. Versos curtos, certeiros. Extremamente simbólica, mezzobarroca até na pegada, que servia apenas para dar uma aura sombria ao poema. Do seu perambular pela noite de Curitiba, em lunáticas aparições, a poeta angariou admiradores. Claro que o conteúdo denso de sua poesia, refletiu longe. Personalíssima no dizer, Bia de Luna, nunca relegou sua vida, pra fora do poema. Estava ali, irmanada com a palavra (vida) em toda vida que vivera intensamente. “Vai meu derradeiro sonho/De vida. Basta – agora aos/Ímpios um lugar frio e/Distante, onde tais almas/Algumas por vezes causticantes,/Que nos gelam o sangue tão/Quente e próspero.” Tudo era é causticante em Bia de Luna, os signos, a vida, as amizades, os amores, as urgências que nunca levavam a lugar seguro. Muitos comprimidos, muitas cápsulas e doses de uísque nessas noites frias e pressagiosas de Curitiba. Na noite as mesmas caras, os mesmos conflitos, as mesmas buscas e o assombro da poesia, ente brusco de vida-morte, perpassando as mesas. A poesia-mulher, femilúnica de Bia de Luna rompe qualquer convenção de linguagem e significação. É lânguida, sutil, laminar, como já disse anteriormente no texto crítico que escrevi sobre Clivagens. “Apague essa vela/Que você acendeu/Na minha sala de jantar/Me deixe no escuro/A ver estrelas/Ou um céu cinzento/Espocado de flores roxas”. O signo furioso, o signo-simples-palavra, arremete fazendo a mais bela poesia. Com a poeta, as coisas aconteciam assim, fortes, carregadas de roxos e cáusticos, reflexo de uma vida plena no poético. Certamente, a Bia de Luna deixou poemas, ou livros inéditos, e esses vão uma hora aparecer pra desafio dos críticos. Pelo visto, essa tarefa ficou para os próprios poetas, eis que os críticos de poesia, são espécie em extinção no país. Guardei a chave da porta./Antes, tranquei. Choveu limão/E orquídeas escorriam pelos/Meus seios febris. Lavei as/Mãos com sal./Não sou estátua./Sou sal. Bia de Luna e seu Clivagens, poesia que transcende a vida e a morte, e marca na sua lira eterna o roxo, o cáustico e o urgente.

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