terça-feira, 20 de novembro de 2007

A CÓLERA DE ZEUS - editoria.



Um relâmpago rasga o céu e atinge em cheio a casa de Licáon. Destruída pelas chamas, num instante ela transforma-se num monte de escombros fumegantes. É assim que, do alto do Olimpo, Zeus, o soberano dos deuses, aquele que lançou o raio, põe fim aos inúmeros crimes desse malfeitor, adepto dos sacrifícios humanos. Desse dia em diante, Licáon, metamorfoseado em lobo, ficará vagando e uivando até morrer.
No entanto, Zeus soube que os cinqüenta filhos de Licáon cometem atos tão terríveis quanto os do pai. Por isso, vestido como se fosse um pobre vagabundo, Zeus apresenta-se na casa deles. Apesar de toda a sua maldade, acolhem o deus disfarçado, pois seguem as regras da hospitalidade. Convidam-no a comer com eles. Trazem para a mesa uma panela enorme. Zeus cheira a comida, e seu coração se aperta de horror: entre os miúdos de carneiro e cabrito, reconhece pedaços de carne humana. São os restos do infeliz Nictimo, o qual seus irmãos não hesitaram em assassinar para comer. É demais! Revoltado com esse crime odioso, Zeus transforma todos os canibais em lobos e devolve a vida a Nictimo. De volta ao Olimpo, o rei dos deuses, desgostoso com a espécie humana, resolve afogá-la sob um dilúvio imenso, que vai engolir o mundo inteiro.
Enquanto prepara esse cataclismo, os homens, sem nem desconfiar do que os espera, dedicam-se a suas ocupações terrestres. Mas um deles, Deucalião, rei da cidade de Tia, visita seu pai, o titã Prometeu, que mora nas montanhas do Cáucaso. Prometeu, que ama os seres humanos (a quem outrora já deu um presente de valor inestimável, o conhecimento do fogo) e sabe o que Zeus está projetando, avisa seu filho. Assim que volta a sua cidade, Deucalião começa a derrubar grandes acácias, a serrá-las em tábuas e ajuntá-las em pranchas. Ao fim de muito trabalho, termina um grande navio, uma arca que parece ter caído no meio da terra seca. Deucalião e sua mulher, Pirra, instalam-se no barco e passam a morar ali.
Um dia, o vento sul começa a soprar com rara violência, acumulando no céu pesadas nuvens negras que escondem a luz do Sol. Milhares de relâmpagos rasgam as nuvens. No meio da assustadora e incessante barulhada dos trovões, a chuva começa a cair brutalmente. Gotas enormes salpicam a poeira dos caminhos e formam uma massa de água que se espalha sobre a Terra.
A água sobe tanto que destrói e engole as cidades do litoral e, depois, os vilarejos das planícies. Quando os céus se acalmam, o mundo inteiro é apenas um imenso mar. De longe em longe, avista-se o pico do que um dia foi uma montanha e agora não passa de uma ilhota. Apenas Deucalião e Pirra sobrevivem, flutuando em sua arca. Durante nove dias, ficam à deriva, na mais completa desolação. Pouco a pouco, as águas começam a recuar, e a arca chega a uma ilha que, na verdade, é o alto do monte Parnaso.
Deucalião e Pirra, hesitantes, pisam a terra, que não esperavam rever. Imediatamente, agradecem ao grande Zeus havê-los poupado e oferecem-lhe um sacrifício. Depois, perto de onde a arca encalhou, descobrem um templo cujo telhado está coberto de algas e conchas. É o santuário de Têmis, deusa da justiça.
Com toda a humildade, Deucalião e sua companheira suplicam aos deuses que reconstituam a espécie humana. Zeus emociona-se com o pedido e envia seu mensageiro, Hermes, para anunciar que concederá o que desejam. Então, surge Têmis, que ordena: - Cubram suas cabeças! Peguem os ossos de sua mãe e joguem-nos para trás! Muito surpresos, Deucalião e Pirra entreolham-se e perguntam ao outro: - Que a deusa quis dizer? Afinal, eles não têm a mesma mãe... E que ossos podem ser esses! De repente, uma idéia os ilumina: qual é a mãe de todos os homens? A Terra! Seus ossos são as pedras que a cobrem...
O casal sai recolhendo todos os pedregulhos que encontra. Depois cada um cobre sua cabeça e, por cima dos ombros, joga as pedrinha para trás. Assim que elas tocam o chão, transformam-se em seres humanos. As pedras jogadas por Deucalião viram homens. As lançadas por Pirra, mulheres. E os dois devolvem a vida à humanidade.
Seria o caso que se repetisse?

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